Grupo do Facebook propõe ações a prefeito que chamou coronavírus de "moda"

Grupo de Facebook vira fórum de discussões de moradores para pautar melhorias na cidade de Ferraz de Vasconcelos (Facebook/ Peter Gomes)

Todo cidadão tem o direito de se reunir com representantes do poder público para cobrar melhorias no seu bairro ou cidade. Na periferia de Ferraz de Vasconcelos, esse trajeto comum de participação política ganhou outro formato, acontecendo por meio de um grupo de Facebook, que tem colhido demandas da população para dialogar diretamente com a prefeitura local.

Por Tamires Rodrigues

Não é de hoje que moradores das periferias de Ferraz de Vasconcelos, cidade da região metropolitana de São Paulo, tentam encontrar formas de lidar com o descaso do poder público municipal. Diante deste cenário, "organizar e provocar" é a definição utilizada por Pedro Gomes, mais conhecido como Peter Gomes, para definir o significado da função dele no grupo de Facebook chamado "Comunidade Ferraz de Vasconcelos", fórum de discussão comunitária que reúne moradores para debater os rumos e melhorias de serviços públicos na cidade.

Uma demonstração clara da força política dos moradores que fazem parte do grupo aconteceu durante uma live do prefeito de Ferraz de Vasconcelos, José Carlos Fernandes Chacon (Republicanos), o Zé Biruta. Na ocasião, o líder do executivo municipal estava reunido com os secretários para discutir medidas preventivas para combater o covid-19. "Brasileiro está se apavorando à toa, mais uma semana e isso ai já sai de moda", disse o prefeito.

"Esse vídeo repercutiu bastante. E o grupo também partiu para o confronto direto com o secretário da Comunicação da prefeitura, que chegou a nos ameaçar de processo. Após isso passaram a tratar o tema com mais seriedade", diz Gomes.

Logo após a intervenção dos moradores, o poder público municipal divulgou algumas medidas iniciais para lidar com o caso do covid-19 na região. Umas delas foi emitir um decreto contratando uma empresa que vai instalar leitos de triagem e UTI em caráter emergencial na cidade.

Gomes acredita que muitos moradores não se deram conta da circunstância que estão vivendo atualmente, mas segue informando e se organizando em rede, verificando a veracidade de todos os conteúdos postados no grupo para não correr o risco de disseminar fake news e ajudando os moradores de sua região a se adaptar com essa nova realidade.

"Hoje estamos com um tópico tentando identificar e divulgar mercados, farmácias e outros serviços de delivery da cidade que estão funcionando para assim evitar que as pessoas saiam de casa", afirma.

Causando impacto

Atualmente, o grupo tem 10.476 membros. Parece pouco se comparado ao último censo do IBGE que estima um número de 168.306 habitantes na cidade.  Mas o impacto que essa rede de discussões comunitárias causa na vida dos ferrazenses torna-se gigantesco perto dos poucos recursos de participação política que esses cidadãos têm acesso.

Então como informar e reivindicar direitos de uma forma que consiga alcançar o máximo de pessoas? Essa foi uma das perguntas que Gomes se fez,  percebendo a popularização do Facebook na época que deu início ao projeto, há seis anos. Com isso, ele  resolveu criar um grupo  que ajude a população a refletir, se expressar e pensar no que é bom ou ruim para a cidade.

"Buscamos usar o espaço para informar sobre o que está acontecendo, cobrar os governantes locais, mas também entreter a população que nesse momento tem que ficar em casa. Também fazemos com muito bom humor para evitar que a comunidade tenha apena um olhar catastrófico", diz Gomes.

Segundo ele, os impactos das discussões são diversos e chegam ao tom de ameaças. "O que soltamos no grupo sempre vai parar nos grupos políticos, a ponto, é claro, de já termos recebido ameaças diversas, processos, etc", diz.

Através do grupo, eles já organizaram protestos e outras ações por melhorias na cidade de Ferraz de Vasconcelos. Gomes acredita que a rede de moradores tem força para interferir nas decisões políticas dos governantes de sua cidade. "O povo comenta muito. O povo está ligado ao grupo".

Informação chegando aos moradores

Uma das integrantes desse grupo é a moradora Julia Sousa, que reside no bairro Parque Dourado. Ela conta que entrou no grupo com o objetivo de saber mais sobre sua cidade, descobrir coletivos culturais ou grupos que se articulam de alguma forma nos territórios, devido à existência de poucos meios de comunicação em atividade na cidade que produzam esse tipo de informação.

"Na internet a gente consegue encontrar notícias sobre Ferraz vinda de grandes meios de comunicações, mas na TV, onde as pessoas daqui têm o maior acesso, raramente", afirma Sousa. Ela diz que as poucas mudanças que a cidade vem conseguindo surgem do uso dessas ações nas redes sociais e complementa: "um grupo desses é de extrema importância, para as informações chegarem até as pessoas, a internet tem essa ótima utilidade".

"Nossa cidade está abandonada há muitos anos. Temos um ex-prefeito preso, um que foi preso e solto, e agora esse que ninguém consegue encontrar direito", diz Sousa.